Encontro promovido pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí mostra a importância da articulação sindical nas negociações entre trabalhadores e empresas automotivas no Brasil e em nível mundial
Iniciados na quarta-feira (14/10) os debates da 2ª edição do Encontro Internacional de Montadoras, organizado pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí (SINMGRA), tiveram continuidade durante toda quinta-feira (15/10) nas dependências do Hotel Intercity, no município da Região Metropolitana de Porto Alegre. O evento que reúne representantes sindicais do Brasil e dos Estados Unidos, propõe a discussão sobre o futuro do emprego nas montadoras de veículos.
Na abertura da programação do segundo dia do encontro, o diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí, Valcir Ascari, voltou a destacar a importância de se discutir o atual momento do setor automotivo não apenas no Brasil mas em nível mundial.
– Nossa ideia é criar um debate global para buscar uma saída da crise que o segmento enfrenta, garantindo a manutenção do emprego e da renda dos trabalhadores – afirmou Valcir.
A primeira palestra da quinta-feira esteve a cargo do economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), Roberto Anacleto, que fez um apanhado do atual momento vivido pelo setor automotivo no Brasil. Segundo ele, a retração nas vendas de veículos é significativa, mas as montadoras não procuram conversar com os trabalhadores para viabilizar soluções que amenizem esse momento.
– Penso que falta uma agenda mais clara da indústria brasileira e que é preciso ter este compromisso para ajudar o Brasil a retomar seu crescimento, que diz respeito a discutir a reindustrialização do país. A realização de fóruns entre os dirigentes sindicais tem condições de formular uma proposta para levar ao governo e contribuir com o processo de resgate da indústria brasileira. É preciso, urgentemente, fazer algo para recuperar a indústria e os seus empregos – pontuou.
Roberto Anacleto lembrou que a situação econômica atual do Brasil, aliada a alta carga triubutária incidente sobre um automóvel fabricado no país é um fator determinante para a redução das vendas de veículos. Segundo ele, um carro no Brasil chega a custar entre 30% e 40% a mais do que em países como o México, cujo modelo econômico lembra o brasileiro. E essa conjuntura leva as montadoras a adotarem medidas como redução da produção, o que impacta diretamente na empregabilidade de seus trabalhadores.
Redes sindicais
Vice-presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM), Mônica Veloso, foi a segunda painelista do dia, falando sobre as redes sindicais. Ela destacou que o trabalho em Redes Sindicais busca promover a cooperação e a solidariedade entre os sindicatos filiados à IndustriAll presentes nas empresas transnacionais do setor de metalurgia, para assegurar que as regras do jogo sejam as mesmas para os trabalhadores cujas condições estejam abaixo dos padrões mínimos.
– As Redes têm sido saudadas, nas duas últimas décadas, como a mais expressiva inovação humana no campo da organização da sociedade. Sem chefe, mas com liderança. Sem “cabeça”, mas toda pensante, a Rede funciona e se sustenta pela vontade e comprometimento político de todos os envolvidos e, portanto, deve ser permanentemente estimulada para a participação proativa dos trabalhadores e sindicatos. É esta sinergia que lhe imprime força e legitimidade. Sem estes princípios bem definidos não há como garantir efetividade em um trabalho de Rede – disse Mônica Veloso.
A painelista lembrou a necessidade da inclusão dos trabalhadores e trabalhadoras da base nas atividades das Redes Sindicais. Para Mônica, é imprescindível que os empregados das empresas participem das ações do comitê, já que eles são os maiores conhecedores da realidade vivida dentro das corporações e os grandes interessados na extensão de direitos e melhoria das condições de trabalho.
De acordo com Mônica Veloso, a criação da Coordenação Estratégica de Redes Sindicais (CERES) em 2013, veio fortalecer a estratégia de atuação em Redes Sindicais da CNTM. A CERES é responsável, entre outras ações, por fortalecer e promover a inserção internacional da CNTM nas discussões de defesa dos direitos dos trabalhadores metalúrgicos, bem como acompanhar os impactos das decisões das multinacionais nas relações de trabalho. E, também construir propostas de formação voltada à realidade, a partir da inserção na ação sindical internacional.
Mônica concluiu sua fala destacando que a Rede Sindical é, em suma, um instrumento de fortalecimento da ação sindical dos trabalhadores de uma mesma empresa multinacional – ou transnacional – nas diversas unidades desta empresa ao redor do mundo, por intermédio da unidade, em busca de igualdade de direitos e melhores condições de vida e de trabalho. Neste sentido, finalizou lembrando ser fundamental intensificar o debate sobre o que é Rede Sindical e o passo a passo para a sua construção e seu desenvolvimento.
Sindicalização nos Estados Unidos
Diretor do United Auto Workers (UAW), sindicato que representa metalúrgicos dos Estados Unidos, Canadá e Porto Rico, Richard Bensinger foi o terceiro palestrante da quinta-feira. Tratando do tema ligado a sindicalização interna, ele destacou que os sindicatos americanos estão tendo que se adaptar a nova realidade de associação voluntária em locais de trabalho sindicalizado, as chamadas open shops.
Besinger ressaltou que existe um grande debate nos Estados Unidos em torno do tema da voluntariedade em se associar aos sindicatos. Tanto que, atualmente, o país possui o mais baixo índice de sindicalização da história, fruto dessa política adotada em muitos estados americanos.
O norte-americano voltou a elogiar a organização sindical brasileira, que está muito mais próximo dos trabalhadores do que seus semelhantes nos Estados Unidos.
– Vejo que os sindicatos devem demonstrar uma atitude positiva, construtiva e não apenas enfocar os atos injustos dos empresários. Os sindicatos devem também ser veículos por meio dos quais os trabalhadores possam apoiar a missão da empresa. Não há necessidade de estarmos sempre prontos para o confronto e sim para a união de todos – avaliou Richard Besinger.
Nos Estados Unidos, não há legislação trabalhista consistente. Direitos como férias, licença-maternidade, auxílio-acidente, seguro-saúde, aposentadoria, participação nos resultados, indenização por demissão imotivada, 13º salário, tão elementares para os trabalhadores formais no Brasil – só são possíveis aos norte-americanos em duas situações: por liberalidade da empresa ou por negociação firmada por sindicatos. Hoje, cerca de 7% dos trabalhadores do setor privado americano estão protegidos por acordos coletivos firmados entre entidades sindicais e empresas no país.
Direitos trabalhistas
O quarto palestrante do segundo dia de atividades do encontro de montadoras foi o desembargador Federal do Trabalho, Ricardo Carvalho Fraga. Ele falou sobre o papel do judiciário trabalhista na aplicação do princípio da proteção, tratando de temas como terceirização, acidentes de trabalho e limite da jornada de trabalho.
Para ele, a terceirização na inciativa privada é um fator que deve preocupar os trabalhadores brasileiros, por gerar um fator que promove distorções nas relações trabalhistas no país. O desembargador falou, também, sobre a contribuição que a Justiça do Trabalho têm dado nas questões referentes aos acidentes de trabalho, lembrando que isso é uma premissa dos trabalhadores brasileiros.
– E mesmo com os avanços da Justiça do Trabalho nessa área, o Brasil ainda é uma dos países com índices gigantescos de acidentes laborais e doenças que surgem em virtude das atividades trabalhistas, algo que nos preocupa muito, já que causa transtornos para a empresa, para os empregados e para a sociedade em geral, que arca com o custo de um trabalhador parado – enfatizou Ricardo Fraga.
Para o magistrado, o momento atual é de absoluto déficit de judicialização penal de acidentes do trabalho. As normas técnicas aplicáveis ao trabalho humano e às profissões, de pouco ou nenhum conhecimento da polícia judiciária (federal ou dos Estados), induz, em 99% dos casos, ao arquivamento prematuro dos inquéritos policiais instaurados para apurar morte ou lesão corporal de trabalhadores.
Em relação à questão do limite da jornada de trabalho brasileira, Ricardo Carvalho Fraga defendeu a ideia da adoção das 40 horas semanais trabalhadas no país. Destacou que o famoso Banco de Horas é algo que desorganiza as atividades das empresas e dos trabalhadores, já que é uma situação em que muitas vezes não se respeita o direito adquirido e, também, promove uma discrepância entre quem deve horas e quem possui horas de folga para gozar.
Redução da jornada de trabalho sem redução salarial
Finalizando as palestras da quinta-feira,SINMGRA, Edson Dorneles, e a diretora do United Auto Workers (UAW), Virgínia Coughlin, abordaram a questão da redução da jornada de trabalho sem redução salarial.
Edson Dorneles salientou que os metalúrgicos sempre atuaram com pioneirismo nas relações trabalhistas brasileiras e a redução da jornada de trabalho sem redução salarial é um feito obtido pelo SINMGRA que muito orgulha a entidade.
– As dificuldades do movimento sindical em avançar nessas tratativas nos levaram a refletir sobre estratégias adequadas para discutir essa questão. E, com isso, conseguimos assegurar essa conquista para os nossos companheiros – salientou Dorneles.
O diretor jurídico destacou que a busca pela redução da jornada de trabalho teve início até antes do reconhecimento do SINMGRA pelo Ministério do Trabalho, o que ocorreu em 2006, com a concessão judicial da carta sindical. Percebendo a dificuldade do movimento sindical em conseguir avançar na pauta nacional pela redução da jornada de trabalho colocada na perspectiva de 40 horas já, é que o Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí estabeleceu sua estratégia.
– A partir da data base da campanha salarial de 2010 com o complexo automotivo da General Motors começamos a trabalhar essa questão paulatinamente e o resultado é que em maio de 2014 conseguimos chegar ao denominador comum de uma jornada legal de 40 horas semanais, sem redução salarial, beneficiando mais de 9 mil trabalhadores da GM no município – disse Edson Dorneles.
Com a repercussão das conquistas do SINMGRA, se iniciou uma expansão das negociações em mais empresas com a mesma estratégia que deu certo, a redução gradual da jornada de trabalho. Hoje, mais de 50% da categoria já tem jornada reduzida, atuando em 25 empresas que utilizam esse expediente.
Finalizando as palestras do segundo dia de atividades, Virgínia Coughlin falou da importância dos trabalhadores se organizarem nos locais onde atuam profissionalmente, salientando que essa é uma dificuldade percebida nos Estados Unidos, onde a sindicalização sofreu redução significativa com a voluntariedade de associação. Segundo ela, o sindicalismo brasileiro é um exemplo mundial, pelo grau de organização e pelas causas defendidas com ardor pelos dirigentes sindicais das mais variadas categorias de trabalhadores.
A programação continua na sexta-feira (16/10) com debates sobre terceirização, com a participação do presidente da Força Sindical do Paraná, Sérgio Butka, medidas criativas para enfrentar a crise no setor automobilístico, com o diretor da GM, Sidnei Alvarez, e a campanha de sindicalização na fábrica da Nissan nos Estados Unidos, com Sanchioni Butler, representante do United Auto Workers (UAW).
Sexta-feira (16 de outubro)
9h às 10h
Tema: Terceirização
Palestrante: Sérgio Butka e Iraci
10h às 10h30min
Tema: Medidas criativas para enfrentar a crise no setor automobilístico.
Palestrante: Sidnei Alvarez, diretor da GM
10h30min às 11h30
Tema: Campanha de Sindicalização na Nissan – EUA
Palestrante: Sanchioni Butler UAW
Informações para a Imprensa:
Sobre o Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí
O Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí representa aproximadamente 14 mil funcionários dos setores metalmecânico, eletroeletrônico, autopeças e montadoras de automóvel. Abrange centenas de empresas do município de Gravataí, na região metropolitana de Porto Alegre, entre elas a montadora General Motors e Sistemistas.